domingo, 10 de novembro de 2013

Irmandade - Capítulo 6

Tomei um banho rápido. Escolhi um vestido preto tomara que caia que se ajustava perfeitamente a minhas curvas e calcei um par de all star. Para dar um ar despojado. Prendi meu cabelo em um coque frouxo. Observei meu reflexo no espelho. Casual e sexy. Olhei no relógio. 19:30. Logo Adrien estaria ali. Fui até a cozinha, peguei uma peça de carne no freezer, abri alguns talhos na carne, encharquei-a com cerveja e coloquei-a no forno. Forrei a pequena mesa. Três pratos com talheres e três taças.
- Que cheiro estranho é esse?!
- Carne. - John surgiu na cozinha, usava uma calça jeans escura e uma camiseta preta. Seu cabelo estava molhado e uma pequena mexa lhe caia nos olhos. Delicioso. Essa era a melhor definição para ele.
- Seu amigo é humano?
- Não. Ele é um vampiro.
- Mas vampiros comem? Tipo nas historias eles só bebem sangue...
- Toda historia tem seu fundo de verdade, só o fundo. Como já lhe disse vampiros são como humanos, só que mais rápidos, inteligentes e bonitos. Um novato não precisa de comida porque o sangue tem tudo que ele precisa, mas com a idade necessitamos de um pouco de comida... É obvio que podemos ficar sem comer, mas acabamos por sentir falta de comer, é como respirar, não precisamos, mas mesmo assim fazemos...  Se te interessar no seu quarto tem uma estante com alguns livros, provavelmente tem algum sobre o assunto.
- Certo... Talvez eu dê uma olhada mais tarde.
A campainha tocou. Olhei no relógio. 19:50. Fui até a sala. Olhei pelo olho mágico. Só vi um sorriso branco e afiado. Abri a porta.
- Está adiantado.
- Não consegui esperar mais. Ver você me deixa inquieto. - revirei os olhos. Observei-o. Adrien tinha olhos castanhos, o brilho prateado estava ali. Sempre estava. Seus lábios carnudos, sempre estavam abertos em um sorriso caloroso. Suas presas tocavam seu lábio inferior. Seu cabelo preto ia até o ombro, levemente encaracolados. Sua pele era bronzeada. Costumava me lembrar um surfista. Era bem mais alto que eu, chutava que ele tinha uns 15 centímetros a mais. Seu corpo era malhado. Um  verdadeiro pedaço de mau caminho. Segundo as outras garotas. Para mim era atraente e quente.
- Aram sei.Vamos entre. - sai de frente da porta, para que ele pudesse passar. Assim que passou ao meu lado seu cheiro penetrou meu olfato, era um cheiro silvestre e quente. Era engraçado. Sempre. Em todas as definições minhas para ele, tinha o adjetivo quente. Abri um leve sorriso. Fui até a cozinha. Desliguei o forno. Era só para dar uma esquentada na carne. Não gostava de comida fria. Vir-me-ei. Adrien e John estavam se encarando.
- John este é Adrien, meu amigo. E Adrien esse é John, meu novato. - os dois trocaram um aperto de mão tenso. Revirei os olhos. Tirei uma jarra de sangue de dentro da geladeira e coloquei na mesa, uma garrafa de vodca e outra de uísque já estavam lá.
- Você teve bastante sorte garoto, ser um aprendiz dessa morena. - John soltou um riso irônico.
- Ou ele teve bastante azar. - resmunguei enquanto colocava a carne em cima da mesa.
- Se é para escolher, fico com o azar. A Valentina é meio... mal-humorada. - abri um sorriso para eles. Tinha que concordar com o garoto. Eu realmente era mal-humorada. E gostava de ser assim.
- Então está decidido, ele teve muito azar. Agora vamos comer? - Adrien assentiu e se sentou. John torceu o nariz.
- Não precisa comer. - disse enquanto cortava a carne mal passada. Tive que sorrir ao ver o sangue escorrer. Quando humana se visse aquela cena vomitaria por semanas e agora já estava salivando. John se sentou. Observou-nos comer enquanto conversávamos sobre amenidades e sobre as noticias do jornal.
- Val a comida estava deliciosa. - Adrien limpou os cantos da boca e observou a travessa vazia.
- Há  quantos dias não come? - resmunguei.
- Não faço à mínima ideia. - ele sorriu. Pegou os dois pratos e os deixou na pia, antes que eu o mandasse lavar, ele completou - Depois eu prometo que lavo, agora porque não sentamos na sala e conversamos? - Dei de ombros enquanto enchia uma taça de sangue com vodca.
- Desculpe a indiscrição, mas como você foi transformado? - a pergunta foi direcionada a Adrien que estava sentado ao meu lado, John estava sentado em outro sofá, em seu olhar estava à curiosidade estampada. 
 - Meu pai era um burguês inglês, tínhamos muito dinheiro. Nasci em 1880, fui um jovem libertino, bebia, jogava, ia a bailes e conquistava muitas garotas, até desonrei algumas. Quando completei 18 primaveras, jeito antigo de dizer 18 anos,  meu pai faleceu e eu era filho único. Herdei tudo, mas não tinha vocação alguma para negócios então vendi a industria e resolvi viajar pelo mundo. Em uma viajem para a França, em 1901, conheci Jolie, uma formosa francesa. Imagine minha surpresa quando ela sugou todo meu sangue e me transformou em um vampiro. Mas como bom boêmio, aproveitei a minha nova vida. Vivemos juntos por um tempo razoável. Um dia acordei e ela não estava lá, mas sim uma carta, dizendo que ela havia partido em busca de novos amores. Vendi a nossa pequena casa e cai na estrada novamente. Mas logo a farra acabou, porque as guerras mundiais chegaram. Uma historia um tanto tola e sem graça. - John ficou calado, a curiosidade em seu olhar foi substituída pelo espanto. Particularmente, a história de Adrien era a cara dele, não poderia ser diferente, ele sempre fora cheio de si e sempre conseguia aproveitar o melhor de todos os momentos. Um cara desencanado.
- Você tem 132 anos?! - Adrien e eu começamos a rir.
- Sim e sou considerado novo, um adolescente.
- Deus do céu! - era engraçado ver a descrença no rosto de John, seus olhos arregalados e sua boca levemente aberta. Adrien passou o braço por meus ombros.
- Mas quem tem uma bonita historia é a nossa amiga Valentina. - senti meu corpo se enrijecer. Não gostava de falar sobre o passado, porque ele sempre vinha acompanhado de uma pontada de dor.
- Não é bonita. É uma história típica de guerra. - minha voz saiu áspera.
- Por favor, Val! Eu gosto tanto da sua história. - revirei os olhos para Adrien que retribuiu meu olhar com um sorriso angelical, extremamente falso.
- Eu gostaria de ouvir. - o brilho de curiosidade havia voltado aos olhos de John. Suspirei e deixei as palavras fluírem. Abri a porta e deixe as lembranças tomarem um ar.
- Minha mãe era uma italiana casada com um alemão, viviam na Alemanha e eram judeus. Nasci em 1920, à filha do meio. Tinha um irmão mais velho e uma irmã mais nova. Logo veio a II Guerra Mundial e a caça aos judeus. Um dia meu pai e minha mãe nós mandaram sair de casa e ir para um casarão abandonado. Saímos pela porta do fundo ao mesmo tempo em que os soldados entravam em casa e levavam meus pais. Meu irmão sempre arranjava comida, vivíamos no sótão, um abrigo anti-bombas e antinazistas. Um dia no ano de 1940 meu irmão foi pego andando pelas ruas, o ouvi conversando com um soldado que o havia acompanhado até a casa, ele iria para guerra. Tornou-se minha responsabilidade cuidar de minha irmã, saía na calada da noite e roubava comida em um mercadinho perto da casa, fiz isso por um mês, até ser mordida por um vampiro, consegui ver minha irmã uma vez, depois caçadores a torturam e a mataram porque queriam saber onde eu estava. Em busca da tal vingança os cacei, eram 3 homens, matei 2 e o outro escapou, foi ai que conheci Adrien. Algum tempo depois a guerra acabou e meus pais voltaram para casa, encontraram uma carta minha dizendo que minha irmã fora morta, meu irmão estava na guerra e eu havia me suicidado, porque me considerava culpada pela morte dela. Eles sofreram muito, mas meu irmão estava vivo, acabaram aceitando os fatos e se mudaram para a Rússia, onde morreram em paz e onde até hoje meu irmão vive com 95 anos.
- É comovente como sua história é cheia de honra e bravura! - peguei minhas lembranças e as guardei novamente.

- É só uma história! Agora chega de falar sobre o passado, deixa isso para os museus.

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